
De repente, o homem percebeu que era um presidiário e no fim de sua jornada, decidiu arrancar as grades. Ao acordar, sua rotina já determinava quem ele era. E o jovem que existiu há quarenta anos, estava com poeira nos pulmões, seus olhos secos, sua aparência transparecia fadiga. No fundo de seu coração, o homem se perguntava porque deixara aquele menino sonhador e tão vivo morrer ao passar dos anos. Os ossos do ofício lhe chamavam, era isso que ouvia todos os dias. Virou escravo da rotina, acabou por vender sua alma, e pensou que no fim pagaria para tê-la de volta. Pois no dia do pagamento, viu que sua alma já não lhe pertencia mais. Aquele homem que estava prestes a lutar por ela, sentindo-se exausto, deixou que o tribunal da vida decidisse por ele. O homem já virara osso, não havia mais calor, não havia mais sangue hidratando seus vasos, sua alma juvenil não voltaria mais àquele corpo. Então sua alma nunca mais lhe fora devolvida. E assim, o homem já não sentia, não sorria, não criava, não vigorava em maneira nenhuma, apenas lamentava-se por não ter zelado pela sua jovem alma sonhadora, hoje tão longe daquele senhor infeliz e arrependido. Ao passo que viveu desprovido de emoção, outros, mundo a fora, viveram como se fosse seu único dia na Terra. Faltou-lhe coragem, a moeda pela qual sua alma foi trocada há décadas.